segunda-feira, 6 de março de 2017

Capítulo 7




      Naquela noite Kar dormiu como o de sempre, mal. Sempre dormia mal, sempre comia mal, sempre ia no banheiro mal (ou era demais ou era de menos). Há muito tempo que havia se habituado a esta rotina, na Noite pouco tempo tinha para descansar, comer, ou qualquer coisa, estava sempre rastejando, procurando comida, armazenando combustível de sua lanterna. Quando saíra do Cosmos, anos antes, levava quilos e quilos de combustível a gás em suas costas, todo dia ia dormir pensando que eles explodiriam bem ali, nas suas costas, nos primeiros, dormia pensando que iria ser atacado, destroçado, devorado, mutilado, torturado... Adquiriu insônia, ficou paranóico e a frustração não ajudava, como eu mesmo disse no início, ele só havia chegado lá dias antes, mas já saíra por anos, por esse tempo vagou quase que aleatoriamente, dando voltas, mas não era burro, começou a desenhar seus mapas, começou a criar seus sistemas de identificação, nunca ficou perdido por absoluto um dia sequer, mas isso não quer dizer que sabia onde as outras coisas estavam. Vagando por uma planície e daí caíndo de cabeça para baixo, escalando uma montanha e batendo de cabeça com o teto, arranhões por onde jorraram sangue, infeçcões por onde o pûs escorrreu, tropeços que quebravam seus, ossos, seus velhos ossos, agora empoeirados e desgastados por ele. Sua língua já exaurida de xingamentos que pronunciava contra si por ter ido a aquele lugar. Mas naquela Noite não era a paranóia, o medo ou a frustração, que o mantinham acorado, era júbilo, pois o trabalho de sua e de outras vidas iria se completar. Sonhou com essa vitória, agora tão próxima, sonhou em retornar para sua terra natal com os projetos e a vitória em suas mãos sonhou então com uma grande imensidão cinza e então percebeu que não era sonho, mas sim o teto, estava acordado.
     Levantou-se e viu que os outros dois ainda estavam dormindo, então pegou algumas fatias de pão, outra de fruta e foi ao banheiro de seu andar. Não era nuito bom, pelo contrário era péssimo, cheirava mal e era estranha e pertubadoramente esverdeado. (a partir daqui, só leia se tiver curiosidade sobre a fisiologia dos boracs) Num canto, estavam as latrinas, muito diferentes das conhecidas pelo leitor, uma vez que fazem suas “necessidades” vômitando seria muito incômodo utilizar as latrinas normais, então ele utilizam uma versão mais longa e alta, onde eles simplesmente colocam a cabeça no topo e os dejetos escorrem até chegar a tubulação... Desculpe por colocar este parágrafo aparentemente inútil, mas serve como resposta a qualquer resposta a qualquer pergunta da ordem fisiológica que você, bem provavelmente, terá.
     Lavadas a boca e mãos, desce para a charutaria, onde iria recomeçar suas buscas por exploradores quando os viu, Joh, Nyaan, San, Lasog e mais um quinto que ele não conhecia, todos na mesma mesa. Joh era um tipo mais parrudo de borac, com chifres e estatura baixa, mas era forte, tinha um ar de seriedade, era de um verde escuro e usava uma camisa amarelada esfarrapada e calças velhas cinzas e largas: “De fato, são roupas para o tipo de calor de Gaul... Gente do deserto.” pensava Kar enquanto se aproximava reparando neles mais atentamente que na noite anterior. Lasog, Nyan e San eram mais magros e um pouco mais altos, seus chifres eram curtos e como topo plano, como o raspado que os militares usam, suas roupas eram similares a de Joh, a exceção de que eram um pouco menos vistosas e mais sujas: “definitivamente são gauleses” pensou ele enquanto reparava no pequeno grupo. O desconhecido, pelo contrário, parecia vir de Riacho Negro, usava roupas menos largas, uma camiseta verde, calças de algodão e seus chifres eram pequenos, era um pouco jovem e Kar o achou estranho:
 --Senhor Kar.--disse Joh
 --Senhor Joh.... Quem é esse seu amigo?....--disse ele um tanto desconfiado
 --Este é Lor... Lor, este é Kar
 --Senhor Kar--apertaram as mãos
 --Então... Vocês aceitaram?
 --Sim....
 --Posso saber o motivo? Para ter certeza...
 --Se acha capaz de sondar o espírito aleio?
 --Talvez... Não custa tentar...
 --.....Falta de opcão....
 --Falta de serviço?....
 --...É...
 --E você Lor? Posso saber porque está aqui?
 --Amigo ouvi os senhores falando ontem... Principalmente a parte dos mil e trezentos sacou.... Quando vi que havia o risco deles declinarem pensei que haveria uma chance para mim me dar bem...--seu jeito de falar era estereótipicamente ode um riacho-negrinho como as roupas indicavam
 --Por acaso o senhor tem alguma ideia do que planejamos?
 --Por mil e trezentos eu iria ao coração da Noite com vocês!
 --Que bom ouvir isso!-- riu
        Kar então explicou a situação e o plano para ele:
 --Olha.... Quando eu falei aquilo cara era apenas exagero.... Isso é muito problemático sacou?... Não vai dar não mano
 --Espere! Um a mais vai ser de muita serventia! Quanto mais forem mais seguros cada um de nós estaremos! As chances são de que pelo menos dois de nós morramos nessa viagem! Com um a mais as chances de dar tudo certo aumentão!
 --Esperar um pourco!--interrompeu Lasog seu sotaque estava melhorando mas ainda estava muito carregado-- Você nãor falou nada disso arntes conosco!
 --Vocês sabiam que eu estava mentindo!
 --....Tudor brem isso ér verdade
 --Desculpe senhor Kar, mas isso é perigoso para caraca!...--o jeito de falar entregava mais do que nada que ele vinha de Riacho Negro--...Não são só os monstros... Há também a questão dos Lordes!
 --Dos Lordes?
 --Claro que dos Lordes! É a palavra deles que iremos quebrar!
 -- Por favor! Entenda! A Ordem é só uma instituição! Não é problema!
         Os olhos de Lor pareceram um pouco irritados com aquela afirmação, mas ele se conteve, não era a primeira vez que vira alguém olhando assim do jeito que ele falava da Ordem:
 --Como assim “Apenas uma instituição”?
 --Olha... Eu sei que você está preoucupado com o que os Lordes podem vir a fazer com você no pós-vida... Eu também estou! Eu sei que serenos julgados! Mas pense! Não há nenhuma proibição no Livro dos Lordes diretamente sobre isso! Ele mesmo foi escrito muito tempo antes da própria Ordem existir!
 --Está sugerindo que a Ordem está mentindo quanto a proibição?
 --...Se eu estiver isso atrapalharia você vir conosco?
 --.....Cê disse mil e trezentos não é?
 --Exato.
 --...Posso saber como pretendem se virar no meio da escuridão? Aquilo é um breu amigo! E ainda há o problema da Ordem em si!
 --Eu... Nós temos um plano....
 --E qual seria?
 --Só posso dizer se você concordar em participar de nossa empreitada.
       Lor parou por alguns instantes e pensou. Passado algum tempo respondeu:
 --...Ok...
       Kar irrompeu num júbilo espetacular. Tinha agora tudo e todos de que precisava a sua disposição e finalmente seus anos e anos de trabalho iriam ser recompensados e com toda essa alegria dentro de si respondeu:
 --Muito bom! Vou falar com meus sócios.
      Se levantou e deixou o grupo conversando, quando saíu da charutaria pareciam estar dialogando sobre a situação política complicada que Riacho Negro se encontrava, com a Ordem ao sul e Cidade de Pedra ao norte uma vez que o país fora montado como um mero estado tampão entre os dois.
      Irrompeu escadas acima e chegou ao quarto vendo que Bou e Ox já estavam acordados. Tropeçou em rofles largados no chão e então começou a falar:
 --Conseguimos! Podemos partir amanhã!
 --O que?--disse Ox
 --Os caras de ontem? Lembram-se deles? Então! Eles aceitaram nossa oferta! Acho que o melhor é descermos e conversarmos os detalhes com eles!
 --Isso é ótimo!--disse Ox-- Agiliza muito as coisas!
 --Não!--disse Bouc-- Temos que encontrar outros!
 --O...--Kar ficou parado tentando compreender, ou pelo menos assimilar, o que acabara de ouvir--....O que?
 --São gauleses não são? Então não prestam! Escolha outros, vai ser fácil...
        Kar continuava um pouco atordoado, com tantas coisas e vontades vindo a sua cabeça que ele mesmo nem sabia qual analizar primeiro:
 --Posso saber o por que?
 --Vão nos matar e pegar nosso dinheiro! É isso que vão fazer isso sim!
 --E posso saber como chegou a essa dedução?
 --São gauleses! Eles...
          De súbito Kar entendeu o que se passava e sua mente se clareou sendo que toda a bagunça foi substituída por um único pensamento:
 --Bouc..--disse Ox que ja enxergara na face de Kar algo que Bouc parecia ser incapaz de ver--... Deixa disso cara! Ja conversamos! Eu também lutei contra os gauleses mas eles só...
 -- “Eles só” nada! Você teve o luxo de lutar na infantaria!--aquilo ofendeu Ox-- Eu tive que passar o inferno naquele maldito cruzador! Cercado de máquinas a centenas de graus sofrendo o bombardeinoesado daquele babacas!
 --Bouc, eu...--disse então Kar antes de ser interrompido por Bouc
 -- E você nem tem o direito de falar nada!! Você abandonou seu país quando ele mais precisava! Nós sabemos que você também é de Cidade de Pedra! Seu sotaque te entregou desde o iní...
     Não pode terminar a frase pois o pensamento aqe passava na mente de Kar naquele momento era de um homicida, mas não chegou a tanto. Kar simplesmente lhe aplicou um soco na cara seguido de um chute na boca do estômago deixando-o de joelhos. Pegou-o então pela cabeça e disse de uma maneira pavorosamente calma e indiscreta:
 --Eu venho trabalhando a anos! Anos! Para entender as coisas por que eu sou um físico, e este é o meu trabalho! Agora, eu tenho a maior chance de toda a minha vida como pesquisador e só preciso manter tudo como está! Logo, você tem duas opções, uma vez que você já sabe demais sobre o plano para eu te deixar ir: um, você vem conosco e não arruma nenhum tumulto quanto a esta questão; dois, eu te enterro em meio a Noite! Qual vai ser?
      Considerando que ainda estamos no início da estória, é mais que óbvio qual Bouc escolheu. Prosseguiram então os três, para a charutaria onde encotraram o grupo falando sobre tatuagens esquisitas que haviam visto naquele lugar. Puseram-se então a conversar, inicialmente falaram sobre os planos e itinerários da missão, depois passaram a falar sobre alguns detalhes da viagem e o que fazer em caso de emergência, foi então que Nyan aludiu a certo evento engraçado que ocorrera em seus tempos de colégio relacionados a rifles, depois Lor aludiu a um evento similar só que relacionado a uma determinada palavra que escrevera na lousa certa vez, por fim, antes que Kar conseguisse restaurar a ordem do que ocorria, Bouc tomou conta da conversação e antes que ele sequer acendesse um charuto, já estavam conversando sobre regras de futebol, cuecas desbotadas e os terríveis erros estratégicos de Riacho Negro na guerra contra Cidade de Pedra. Sem outra escolha, Kar continuou fumando seu charuto tranquilamente e ouvindo a conversa, quando sentiu que já era câncer demais por um dia (não ignorava isso, só não se importava porque achava que seu vício era mais importante que sua saúde, sabia que um dia teria que parar, mas até lá), Levantou-se discretamente e foi resolver seus próprios assuntos.
       Saindo da charutaria, comprou algum material e começou a trabalhar em alguns designs que havia pensado da penúltima vez que encontrou um dorac. Foi mais rápido do que pensou então passou o restante do dia deitado descansando e aproveitando, sabia que aquela seria a última vez, em semanas, que teria o prazer de deirar calmamente, dormir direito, sentir o sol em sua pele... Se entediou e ficou lendo na janela do apartamento até os outros dois voltarem já completamente altos, o grupo aparentemenre havia visitado uma adega de citra de niz antes de voltar, mas não precisou olhar para eles pois o cheiro os antecedeu em muito.
       Enquanto tudo isso se passava, Bahr persistia tentando lidar com a situação:
 --Então?.... Alguma coisa quanto a Gaul?
 --O embaixador Rzar de Gaul já conferiu com nossos informantes senhor, nada! Não há nenhuma evidência de que alguém de Gaul e tenha conseguido passar por nossas barreiras--respondeu o Primeiro Secretário, era um tipo tanto esguio, alto e calmo, ligeiramente simpático
 --.....Bem, só sobra Cidade de Pedra então!
 --Na verdade senhor, ainda não tivemos nenhuma informação sobre Euler...
 --Euler é uma ilha de monges! Não nos incomodam... O que os informantes de Cidade de Pedra já conseguiram? Alguém saiu do país ilegalmente?
 --Muitos casos senhor... Mas nada relacionado conosco. A maior parte eram imigrantes fugindo para Riacho Negro ou para Euler... Para cá, nenhum, os que foram para Gaul estava  de viajem...
 --Tem certeza disso?
 --Senhor, checamos os registros da polícia dos últimos cinco anos de todos os países!
 --Com exceção de Cidade de Pedra!... Eles se movimentam para a guerra...
 --Senhor, posso saber como chegou a esta conclusão?
 --Simples, eles abaixaram os juros.
     Estavam eles no setor de contabilidades e burocracia da Ordem, mais especificamente, no depósito de registros de viajem de outros países, eles conseguiam isso através de seus “informantes” nos departamentos de imigração de cada nação. Era uma salão gigantesco, lotado em todos os centímetros por grandes armários de metal com papéis alaranjados e velhos contendo todo o tipo de informação. Além dos dois, havia quase que todos os burocratas da instituição, o Bahr estava sentado numa cadeira, no chão, iam centenas de quilos de papel:
 --Senhor...--disse ele um pouco desconfiado--... Nenhum de nossos informantes em nenhun país confirmaram qualquer missão ou expedição a Noite... E eu não consigo entender qual é a relação entre a taxa de juros e uma guerra...
 --Bem, para as guerras o Estado precisa de dinheiro não precisa?
 --Sim senhor.
 --E Cidade de Pedra tem dinheiro?
 --Não senhor.
 --Então eles vão ter que fazer o que?
 --Pegar dinheiro emprestado senhor.
 --Agora vê a relação?
 --Mas como tem certeza que é para uma guerra senhor?--dizia ele com um tom sarcástico, estava entedian o de tudo aquilo-- Podem estar simplesmente querendo incentivar sua economia ou....
 --Por que....--não gostava de ser contrariado--...a “Armamentos de Pedra e Cia” acabou de publicar no jornal uma expectativa de lucro imensa para esse ano, dito isto, nossos informantes de departamentos de estado de Riacho Negro, Gaul, Euler e mesmo Porto de Pedra não relataram a compra de nenhuma grande leva de armas importadas este ano, então....
 --Desculpe senhor...--estava com raiva, mas engoliu
 --Pare com isso! Quero resultados! Marechal? Onde está o general?
 --No banheiro
 --No?!....Ele ja está lá a meia hora!
      Levantou-se então e começou a rumar ao banheiro, mas tropeçou na própria capa, depois rumou normalmente até o banheiro, cinco minutos depois, trazia o marechal devolta puxando-o pelos chifres enquanto este ainda estava desorientado pelo que acabara de ocorrer:
 --Então? Marechal Dru!? Algum resultado?
 --Senhor, os navios não encontraram nada, e o dirigível também não...
 --Puxa?! Não encontraram nada? É melhor então assumirmos que os guardas ficaram malucos e que nada aconteceu!... E agora Marechal?! O que fazemos hã!?
 --Eu já estou lidando com isso s...senhor! Me encontrei com o Marechal da Força Aérea e...
 --Espere um pouco! Vocês dois se encontraram sozinhos?
 --Sim.
 --Ah!... Viu Primeiro Secretário! Era esse o barulho de coisas quebrando que agente ouviu ontem...
 --Isso explica o olho roxo do marechal hoje de manhã...
 --Bem, marechal, continue!
 --Bem....senhor.... nós nos organizamos e eu enviei alguns dos meus efetivia especializados nesse tipo de coisa para lá...
 --E?....
 --Até agora nada senhor... Estavam seguindo a trilha deles pela cidade baseados em algumas anotações dos saqueadores, mas quando pensavam que iam encontrá-los a pista esfriou. Mas já dei um jeito, só precisamos aguardar novas informações...
 --Ótimo.... Agora volte para o seu posto, para o seu posto!, não para o banheiro, não quero mais de desperdício de tempo! E fique aguardando!--o marechal saiu as pressas-- Primeiro Secretário, e nossas forças em terra? Como vão os exercícios?
 --Vão bem senhor... Mas ja viraram matéria de jornal em Riacho Negro, estão achando que...
 --Isso não importa! Sempre declaramos guerra formalmente antes de atacar! Isso é só paranóia pública!.... Ok, vamos revisar nossos itinerários para esse mês enquanto eles terminam a última revisão, então estão liberados!
 --Bem senhor... A começar pela sua reunião com o novo “Primeiro Ministro” de Cidade de Pedra no fórum internacional que vai ter em Planície Amarela...
 --Sim, sim, este é importante... Meus discursos já estão prontos?
 --Só falta um senhor!
 --Ótimo, mas deixe que o discurso principal fica comigo! Vou improvisar este ano! Ou pelo menos é o que os outros líderes vão pensar que eu fiz! Vão ficar impressionados! E o que mais ainda para esse mês?
 --Tem a visita anual a Vale Verde, para a cerimônia de verão. Já estamos fazendo verificações de segurança...
 --Alguém querendo me matar?
 --Duas células foram encontradas senhor e...
 --Primeiro Secretário?
       Olhando para trás, o Primeiro Secretário (não se preoucupe com o nome deles pois nem eles o fazem, eles preferem os títulos e isso acabou virando uma tradição), viu o segundo, que chegava para o seu turno, estavam se revezando com o Mestre desde que aquela situação iniciara. Largou o que estava fazendo e voltou para sua mesa na sala dos secretários, antes de ir, pediu uma sopa pelo sistema se comunicação por tubo que ligava quase todas as salas dos membros mais importantes com a cozinha. Quando chegou lá quinze minutos depois, o prédio era realmente muito grande, Kzar, o entregador, estava com a sopa na mão. Ele pegou a sopa e agradeceu com um aperto de mão.
      Horas se passaram antes que seu turno acabasse, mas quando acabou Kzar, um borac um pouco gorducho e baixo, saiu tranquilamente pelas imensas portas da sede e cruzou a cidade a pé. Primeiramente atravessou o centro, as ruas do centro eram todas repletas por casas e ruas antigas, com velhas casas e prédios construídos no estilo gótico, com ruas pavimentadas e organizadas com a atmosfera repleta do som de carroças de comida e transporte, puxadas por boracs é claro, e do cheiro de pães e doces das confeitarias. Mas enquanto atravessava as ruas, as coisas foram mudando, as casas góticas foram substituídas por prédios de apartamentos de média qualidade, depois pelos distritos industriais e por fim vieram os bairros dos “azarados”, boracs que faliram em geral, regiões lotadas de mutilados em guerra, alcólatras, investidores endividados e muitos, muitos tipos de radicais políticos. No meio dessas ruas que cheiram a vômito feitas de casas de pau-a-pique estava um borac diferente, não nas roupas, estas eram velhas e esfarrapadas como do pessoal local, porêm estava mais calmo do que o resto, segurando uma panela de aço como forma de pedir esmola. Kzar jogou-lhe algumas notas de dois e foi para seu bairro.
       Afundando seus pés na lama, o borac seguiu calmamente por entre as ruas periféricas até que começou a chover, temendo o pior, cortou caminho pelo distrito industrial até chegar numa estação de trem onde encontrou um carregador, chamado Tru, usando o típico uniforme cinza com botões e chapéu baixo das ferrovias de Elsinor. Eles se esbarraram e então começaram a conversar baixinho:
 --Já pegou?--disse o mendigo
 --Já.... Peguei no seu bolso.
      Tru havia deixado cair uma das malas    “acidentalmente” e enquanto catava conversavam, parou apenas por um instante para olhar o que estava escrito:
 -- ”Vai improvisar no discurso”?Só isso? Sério?
 --Não é culpa minha! Nem sou que consigo a informação!
 --Mais baixo... Ok, tudo bem, mas não sei se isso vai dar muito dinheiro... Talvez o cara de Gaul, os dodge de Gaul é muito orgulhosos e gosta de ter este tipo de informação.
 --Eu não seu do que você está falando.... Não li... Mas tudo bem. Agora embarque! Senão não vamos ter nada para dar para a Ordem semana que vem!
     E assim Tu embarcou, estes quatro indivíduos sem relevância eram parte da chamada “Rede de Informações” que a maior parte dos líderes mundiais do Cosmos gostam de usar quando seus próprios informantes falham em oferecer mais do que é possível. Raramente oferecem alguma coisa útil, mas na paranóia que o Cosmos estava vivendo até mesmo as informações inúteis como aquela estavam recebendo um bom preço. E ninguém é entendia desta paranóia melhor do que o próprio Bahr:
 --Estão se preparando, eu sei!
     Não totalmente sem fundamento, já algum tempo calculava  que a Cidade de Pedra se preparava para a guerra o único mistério era:
 --Por que? Por que se preparar para a guerra? As secas já foram embora! Nenhum furacão os atingiu! Deviam estar dando glória aos Lordes que a quase quatro anos que o país deles não é atingido por nenhum desastre! Nem nós conseguimos ficar este tempo sem que uma maldita nevasca pare nossas ferrovias!
      Aquela noite era ja a terceira noite que dormia sem nenhuma boa novidade sobre a crise causada pelos boracs que haviam retornado da noite e por isto dormia ainda pior do que na noite anterior.
      Não era o único, Kar também sofria para dormir enormemente, não por estresse, mas por estresse, mas por ansiedade. Estava no teto da pensão, admirando um pouco as estrelas, abaixo de si, centenas se moviam e era possível ouvir o fraco som de conversas e risadas, o que mais se destacava de todos aqueles sons era onsom de um violão tocado ao longe quando viu a Lua emergir por detrás de uma nuvem. Não era uma Lua normal, estava cercada lor uma grande auréolá esbranquiçada, quase que num círculo perfeito, e brilhava grandemente. Era linda. Vendo aquilo, pensou:
 --Vou ter que acordá-los mais cedo!
       Uma hora depois estava no apartamento, com um balde de água do mar na mão e os outros dois a menos de um metro de distância. Uma vez deserpertado de maneira tão razoável Ox falou:
 --Mas que porcaria é essa?--sacudia as mãos tentando secá-las embora já sentisse as primeiras dores de cabeça da ressaca que teria pelo resto do dia.
 --Vamos acordem! Temos que descarregar tudo isso agora! Levar pro barco agora!
 --Barco!? Mas...
 --Eu aluguei um para nos levar! A viagem vai durar uns dois dias...
 --Mas....--caiu no chão devido a dor de cabeça e vomitou
 --E depois reclamam dos meus cigarros né? Bem parece que seu fígado também não deve estar indo bem!
 --Por que só acordou a mim? E o Bouc!?
 --Eu joguei água nele também, mas parece não ser o suficiente.--saiu do quarto e pegou o outro balde que ele trouxe para caso aquilo ocorresse
 --O que? Onde?--e então Bouc vomitou
 --Mas que que deu em você Kar?
 --A lua está com uma auréola
 --...... MAS QUE PORCARiA ISTO TEM HAVER?
 --Significa que há muita umidade no ar e que vai cair uma chuva. O que somado aos ventos quentes vindos de Riacho Negro podem provavelmente virar um furacão.
 --Furacão? Ora e o que uns ventinhos podem fazer?
 --Já viu furacão?
 --Não.
 --Muitos se quiser saber... Agora vamos! Temos que por tudo isso no barco que eu aluguei enquanto dormiam! Ox, você não, você está vomitando demais, vá e encontre os caras que contratamos! Devem estar jogados pelas ruas ou algo do gênero!
 --Mas como vou fazer isso se estou vomitando?
      Kar estendeu então o balde para ele e ele entendeu o que aquilo significava. Ele saiu e foi a procura dos outros enquanto Bouc e Kar carregavam o mateiral do apartamento deles para o barco.
     Uma hora depois deles mesmos terem terminado apareceu Ox com o resto, embarcaram no navio. Estavam quase saíndo quando de súbito apareceu o dono da estalagem correndo como um louco em direção ao cais e lembraram que não o haviam pago:
 --Voltem aqui seus babacas, retaradados, idiotas!.. Vocês são tudo um bando de caloteiros! Seus bosti...
     Antes que terminasse Kar sacou o dinheiro e o pagou:
 --Muito obrigado! Vão com a graças dos Lordes hein? Voltem sempre!
     E assim partiram. Kar correu para a popa e ficou a observar o cais e a cidade como um todo desaparecer ao longe enquanto as nuvens começavam a girar cada vez mais rapidamente ao fundo criandononque em poucas horas seria o olho do furacão, tudo isso ao som de vômitos e resmungos de terem sido acordsdos cedo demais fazia Kar se sentir grandemente realizado enquanto paetia para encontrar os frutos de seus anos de trabalho.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

Capítulo 6

A areia estava fria, a noite estrelada, o vento leve, a atmosfera horrível, os gritos de todas as direções, a escuridão permeada pela luz de projéteis. Um veículo em chamas a sua frente e Ox, com uma baioneta, corre cegamente para frente, chega a uma trincheira, projéteis luminosos voam sobre sua cabeça, acertam a cabeça de alguém a sua frente, seu capitão, o tenente morreu na praia, Ox chega a uma trincheira, chama os colegas, eles se abrigam na trincheira. O tiroteio para, o terror cresce, começa o bombardeio, uma bomba cai a metros dele, o barulho lhe deixa surdo brevemente, ergue a cabeça, há cinco mortos na trincheira. Ouvem então gritos, não, hurros, estão o atacando, grita, instintivamente: “Baionetas” todos obedecem: “mirem” eles obedecem: “atirem” eles obedecem. Ouve-se som de gritos, de carne cortada, de apocalipse, baionetas surgem a metros deles, na escuridão, eram centenas, mas eles também, Ox pega seu martelo, sua baioneta e grita: “comigo” e atira uma granada no inimigo, mas não no centro, a esquerda, e então guia seu esquadrão para a direita e os cerca. Sua coluna de baionetas contra outra, mas carne cortada, o chão fica úmido, um cheiro fétido e aterrador permeia o ar e de súbito vem a luz do sol. Um teto de concreto aparece, é de madrugada e Ox sente o vento do mar e o cheiro do lixo adentrando pela janela. Ergue a cabeça e ouviu os outros dois conversando:
--Você tem que entender que as prisões não são para corrigir os criminosos, mas para puni-los! De certa forma elas só pioram a situação ao liberar pessoas que foram torturadas intensamente na sociedade!
--Mas os Lordes dizem que todos temos uma parte boa e outra má! Então as prisões....
Não se incomodou em distinguir quem falava o que. Já era a enésima vez que aquele sonho lhe atormentava, mas já não se importava com ele, já a algum tempo havia se acostumado a ele e de certa forma, agora já lhe era quase reconfortante, fazia parte de sua rotina diária e não compartilhava este fato com ninguém.
Erguendo o restante do corpo, viu que haviam comprado pão p e que este ainda estava quente assim como algumas tais (uma fruta seca similar ao damasco), tirou a barriga da miséria e pôs-se a falar:
--Então? Como vamos fazer.... Digo, como vamos recrutar pessoal e tudo mais?
--Ele tem razão...--disse Bouc--... Equipamento e suprimentos vai ser fácil, mas é pessoal?
--Acalme-se. .. Estamos numa cidade famosa por ser lar de gente sem opção... Sei como encontrar gente por um bom preço.
--Como?
--Cartazes.
--Cartazes? Está maluco! Vamos simplesmente sair anunciando pelo mundo que vamos desafiar as leis da organização mais poderosa de todas?
--Claro que não seu idiota! Vamos encontrar nos cartazes de “serviços especiais”... Há vários grupos e indivíduos mercenários pelo local... Tudo que temos que fazer é procurar aqueles que cobram preços razoáveis.... Bouc!
--Sim?
--Você vai ficar de olho no dirigível!
--O que?...Mas porque eu?!
--Dirigível?--disse Ox, com ansiedade correu até a janela e viu, aterrorizado, o zepelim da Ordem estava ancorado na borda da ilha. Era uma estrutura curiosa, com um balão cilíndrico de cem metros de comprimento e quarenta de raio, o balão cinza carregava abaixo O que parecia ser o cesto da aeronave, este, por sua vez, era uma estrutura de aço com o formato de um barco mas adaptada aos ventos e aos cabos que a prendiam ao balão. Ox a olhava aterrorizado
--Por que não confiamos em você com dinheiro
--Oh... Bem então nesse caso tudo bem... O que devo fazer!?
--Assim que perceber que nos encontraram deve vir correndo a este prédio, vou ficar na janela, você fica ali do lado de fora com este pano, faça um sinal qualquer e então em escondo
--Se esconder? Mas como pode se esconder num cômodo deste tamanho?
--Se esconder? Eles já nos encontraram!--Ox ficava ainda mais desesperado a cada minuto-- Mas como? O que nós...
--Sem pânico cara!--lhe disse Bouc-- Ele vai te explicar tudo!
--Vem aqui que eu te explico... Bouc, pode ir.
--Ok!--e saiu
-- Primeiro lugar acalme-se! Sem pânico! Tá?
--Tá, tá..
--Ótimo, agora me escuta, agente não precisa temer a Ordem.... Tudo bem, a gente precisa! Mas ouça! Desde que eles não nos encontrem vai estar tudo bem! Só precisamos ficar fora da vista deles!
--Mas você disse que eles viriam aqui! E que você teria que se esconder!
--Eu sei... Mas não se preocupe porque eu posso dar o meu jeito... Agora veja o que você tem que fazer hoje! --deu-lhe então uma lista de materiais e equipamentos que provavelmente iriam precisar, era uma lista grande
--Mas e o dinheiro?
--Está aqui!--sacudiu então uma sacola de dinheiro na frente dele-- Eu vendi a maioria de manhã...
--Tão rápido?! Mas como?
--Vendi mais barato do que valem... Alêm disso já são quase meio dia! Você dorme demais!
--Desculpe.
--Não se preocupe com isso! Agora vá, temos que ficar o mínimo de tempo possível aqui.
--Mas e você? O que vai fazer?
--Vou traduzir os mapas do 2D para o 3D e depois de novo para o 2D, só que adaptado para nós
--....Hã!?
--Os mapas que temos são de antes de Grinard ser destruída, na época em que ela ainda era plana, não servem para os dias atuais em seu estado bruto! Mas existem algoritmos, alguns que...--sua voz se encheu de soberba--....eu mesmo inventei que podem traduzir este mapa para que nos seja mais útil.
--Entendi.
--Bem, o que está esperando? Vá logo!
Ox saiu do prédio e logo já estava no mercado. Alugou uma carroça para carregar as coisas mas sabia que na Noite elas seriam inúteis. Fazia questão de olhar para os lados, como se a qualquer instante alguém fosse saltar para lhe prender, o que inadvertidamente, trazia ainda mais atenção para si. Também não parava de olhar para a nave, que jazia parada no mesmo lugar que estava algumas hora antes.
Ao entardecer já perderá o medo de, o dia todo havia se passado sem sequer ter visto os soldados, então tudo devia estar bem. Recolheu tudo que havia conseguido na carroça e a levou para a pensão. Foi quando estava virando a esquina que os viu, cinco soldados e seu capitão, metralhadoras em punho, armaduras contra bomba, punhais e seu coração na boca. Pode sentir na hora a pulsação aumentando entrara em pânico, e por vários instantes ficou a encará-los dando a volta na esquina e se dirigindo a pensão. Estava preste a sacar sua arma ou sair correndo (ainda não havia decidiu qual dos dois) quando viu que entravam na charutaria e não subiam as escadas: “estão chegando perto” pensava consigo mesmo em pânico, mas então se acalmou, respirou fundo e se acalmou um pouco mais, decidiu que tinha que fazer alguma coisa.
Olhou pela estreita rua lotada de barraquinhas, a maioria de comida (bolos, pães, doces, de niz e algas e naturalmente, granadas). Não via Bouc em lugar nenhum, colocou então a carroça encostada contra uma parede e se esgueirou por entre algumas barracas até a frente da pensão, tentou ver Kar pela janela, nada. Sem entrar em pânico, mas quase, pensou em subir para avisar Kar mas então viu os soldados saindo da charutaria e subindo as escadas. Nos momentos seguintes, aguardou em desespero que emergissem daquele prédio poerento e velho com Kar nas mãos esperneando e gritando, mas saíram instantes depois sem nada e aparentemente desapontados. Os observou se afastarem e quando julgou seguro subiu Se encontrou com o braço do qual não gostava, subiu as escadas até o quarto dezessete, abriu a porta e...nada. Não havia nada nem ninguém lá. Saiu pelos corredores em confusão quando, de uma das portas do prédio, surgiu Bouc:
--O que? Mas como?
--A gente só teve que pedir para o cara nos trocar de quarto!
--Mas eles não revistaram o andar todo? Só um quarto?
--Os caras passaram os últimos três ou quatro dias espremidos num dirígivel, acha mesmo que estavam com saco para ficar revirando quarto por quarto?
--Puxa... Eu não tinha pensado nisso.... Muito inteligente Bouc!
--Não... Foi o Kar que me explicou isso.
--Está explicado... E onde ele está?
--Ele terminou aquela coisa dos mapas que estava fazendo e me deixou cuidando das coisas... Ah ele pediu para você botar as coisas aqui encima e então vamos encontrá-lo lá embaixo.
--Ótimo!
Desceram rapidamente e descarregaram a carroça. Terminado o serviço, devolveram a carroça e voltaram para encontrar Kar numa mesa com bebida em outros quatro boracs.
A charutaria era um ambiente sufocante e quente, todos suavam e fediam terrivelmente, mas como não podiam desistir do sabor do kurja se mantiam naquela atmosfera permeada por fumaça e tosses. Era grande, do tamanho de um restaurante, o balcão, alêm das muitas espécies de folhas de kurja, também ofereciam alguns bolos e bebidas de niz assim como potes com tariz (mas ninguém as pegava porque todos sabiam que ninguém ali lavava as mãos). Havia várias mesas de madeira barata e num canto perto duma janela, estava Kar a alguns boracs que encontrara, riam uma risada forçada de quem não tem nada a dizer. Bouc e Ox se sentaram:
--Ué? Bouc? Você está aqui?
--Sim... Por que?
--É que eu pensei que a ordem.... Nada, nada.
--O que você quer dizer com isso?
--Deixe eu lhes apresentar alguns interessados em nossa empresa
--Olá,...--disse estendendo a mão--... Sou Ox
--Eu sou Joh....
--Kar o que você quis dizer com aquilo?
--...estes são Nyan, Sam e Lasog...--sua voz simulava certa calma, mas latejava um certo misto de ansiedade com raiva, Ox não sabia o que era, mas podia ver bem em seus olhos algo de errado, uma certa inquietação. Bouc, não via nada pois ainda estava pensando no que Kar queria dizer com aquilo, mas já começava desistir até mesmo porque apoiou o plano de deixá-los ir na frente para morrer naquele porto--...Então senhores, no que podemos ser úteis?
Kar explicou a presente situação a eles brevemente e esperou a reação, viu os quatro tremularem brevemente e olharem ao seu redor:
--.... Isso é uma situação complicada....--disse Joh coçando o queixo pensativamente--... Observem que não era bem isso que tínhamos em mente quando o senhor nos chamou...
--Posso saber o que tinham em mente então?
--....Não sei... Segurança de alguma fábrica ou alguma coisa, ou roubo de carga, algo do gênero....
--Viu! O lado bom de nossa iniciativa é que é totalmente legal!
--Totalmente legal?!... Sério!
--Kar, do que você está falando?--disseram Ox e Bouc igualmente confusos
--Observem! O serviço que propomos está bem no coração da Noite certo?
--Certo...
--Então!? Por acaso algum Estado Nacional está lá?
--Algum o que?
--Algum país! Um país!
--Não...
--Então! Logo não há uma juridisção sobre aquele lugar, portanto, não é ilegal ir para lá!
--........Mas não é das leis que tememos! É da Ordem!--disse Lasog antes de se contrair nervosamente diante os olhares de reprovação de Joh, que parecia querer puni-lo por falar sem seu consentimento
--Calma! Calma! A Ordem não vai nos pegar!
--Como porde ter tanta certeza disso?
-- Simplesmente por causa disto! --e colocou sobre a mesa um mapa do Cosmos com uma linha vermelha destacando uma passagem por entre as montanhas
--Hum.... Está bem longe da Passagem e tudo mais....
--Longe? Haha... Está a dias de vigem de lá! Está a dias de viagem daqui!
--Provavelmente não deve ser patrulhada... Mas ainda assim não quer dizer que estejamos a salvo... Como venderiam a máquina aqui?
--Não é a máquina que nos importa, são os projetos! Só precisamos chegar lá, descobrir como funciona e aí voltar! Vocês recebem o dinheiro prometido e tudo bem quando termina bem!
--Espere um pourquinho aí!... A Ordem não é o único risco desta empresa não! Não se esqueçam de todo aquele zoorlógico que há lá fora!... Não quero parar no estôrmago de um daqueles bichos! Eu...
--Monstros!? Haha--Bouc se intrometeu abruptamente na conversa lançando seu tom irônico e falso de costume-- Este borac aqui matou um dorac sozinho! Eu estava lá! E ele também --disse ele colocando a mão no ombro de Ox-- Aqueles monstros não são grande coisa! Podemos nos livrar deles com o que compramos!
--E or que vocês têm?
--Ox!?
--Temos dez rifles, seiscentas balas, vinte granadas e um morteiro com vinte bombas.
--E suprimentos?
--Temos três meses de ração para dez boracs, alêm disso comprei os casacos mais quentes que consegui, alguns turuks...--um fungos que impede as infecções--... E combustível para mais de novecentas horas...
--Isso dá.... Um pouco mais de dez horas por dia, porque ser tão....
--Os horários de caça dos habitantes da Noite ocupam as outras catorze horas...
--Não sei não... Quanto estão dispostos a nos pagar?
--Mil e trezentos para carda um...
--Mil e ....?!?!--ficou atônito, era muito mais do que esperava, estava prestes a aceitar quando algo lhe veio a mente, pensou um pouco e então, encarando-os com toda a seriedade possível--.... Existem muitos daqueles bichos lá?
--Não!--disse Kar
--Imagina!--disse Ox
--...Nem são tão grandes assim!
--Nem são tão grandes assim?.... Então vocês se encontraram com eles?
--...S...Sim--disseram os três
--O grupo de vocêrs era maior?--encarava-os freneticamente
--Só nós três--disse Kar
--...É...
--...Jak-- O olhar de Joh havia lhe atingido de forma que ele não contava, ou seria o medo? O medo da culpa de estar enganando outros para terem o mesmo destino de Jak? Sua mente estava tão confusa que nem eu, o narrador, conseguiria analisar, mas fosse como fosse, não conseguia tirar de sua mente a ideia de Jak sendo queimado vivo por aquela terrível besta
--Então havia mais um?
Os três desviaram o olhar, não tinham raiva de Bouc pois os mesmos pensamentos lhes corriam pela mente:
---Vamos precisar de mais tempo para pensar... Nos encontramos depois do culto
--Depois do culto?--disse Kar com certa preoucupação
--Sim, hoje é sábado não sabia?--disse com certa ironia
--Ah não!--disse Kar com angústia-- Eu tinha me esquecido disso!
--Eu também!--disse Bouc igualmente em pânico
--Deixem de frescura vocês dois!...--disse Ox-- Mas Lasog, San, Nyan benhum de vocês tem uma opinião formada?
--Joh pode responder por nós...--disse Nyan
--Mas,..--algo lhe impediu de continuar e o grupo saiu da mesa
--Droga...--disse Bouc--...Você vai ter que procurar mais Kar... Esses aí não vão topar...
--Pelo jeito não vão mesmo... O que é uma pena pois quer dizer que vamos ter que perder mais um dia aqui e...
--Não há problema nenhum... --disse Ox com certa teatralidade, aproveitando da oportunidade-- Estes aí vão aceitar, pode ter certeza.
-- Como?--disse Kar surpreso
--Viu o casaco a roupa que usava?
--A camisa branca e as calças? O que que há?
--Eram do exército de Gaul!
--O que?.... Mas o que isso tem haver?
-- “O que tem haver?” O que tem haver é que estes são quatro desertores do exército de Gaul! E Joh, o capitão ainda deve ser o líder deles por algum tipo de cumplicidade.
--Desertores? Mas... Mas como você pode saber isso?
--Você viu as roupas não? Viu o jeito como falavam? O sotaque?
--Vi... Ou melhor, ouvi, mas....
--Ora veja só o jeito de desesperado deles! O quanto que oferecemos só atrai aqueles que já não tem mais opção! E aqueles que vem para cá são os mais sem opção que existem! E quais são aqueles que estão mais sem opção de todos?
--Os procurados.
--Exato! Devem ter fugido de seu país pois desertaram do exército o que dá pena automática de morte! Eles fogem do país largando suas coisas para trás e vem para cá! Em busca de algum serviço que lhes sirva para reiniciar a vida em algum lugar! Hahaha!--e brindou sua brilhante dedução bebendo um pouco de licor de niz
--Bela dedução.... Mas pode ser outra coisa...
--O que?
--Pode ser que eles tenham assassinado alguém e tenham fugido largando suas coisas para trás...aí eles vem até aqui e esperam que um grupo de idiotas lhes ofereçam uma boa quantia para depois os sequestrar e roubar seu dinheiro-- comemorou sua própria brilhante dedução com um copo de licor de niz
Os três ficaram quietos diante da até então impensada possibilidade:
--Seja como for, é o melhor que vamos arranjar... São os únicos que não cortaram a cabeça de ninguém ou traíram alguém por essas bandas...
--Tem razão... Agora...--olhou então para o relógio de parede-- São seis e meia, temos que nos apressar se não perderemos o culto
--Droga! Estava vendo se você se esquecia disso!--disse Kar
--Eu também!--disse Bouc--Eu te disse que ele é muito chato com essas coisas!
--Deixem disso! Agora vamos sair deste lugar! Posso sentir o câncer crescendo no meu pulmão enquanto falamos
Saíram da charutaria e viraram em três esquinas até chegarem na Rua de Todos os Lordes, onde ficava o templo da Ordem em Ponte de Pedra. Kar queria um lugar no fundo mas Ox insistiu que sentassem na frente.
Apesar de viverem lugares diferentes, falarem línguas diferentes e até terem convicções políticas diferentes, todos os boracs estão unidos no que diz respeito ao que diz os Lordes (e se você tivesse passado por tudo que eles passaram também teria). Apesar de nem todos gostarem de frequentar os cultos (de fato a maioria não gosta) tosos sabem que tem que ir, ou os Lordes ficam sabendo. E como Porto de Pedra não era exceção a cidade também contava com o seu próprio templo. Era uma estrutura simples, com oitenta metros de comprimento, por vinte de largura e quinze altura. Havia uma escada que ligava a uma arquibancada no andar superior (onde ficavam sentados os membros mais importantes da sociedade de Porto de Pedra, os saqueadores negros, com suas bandainas e camisas características). As paredes eram pintadas de branco e tinham algumas estatuetas dos Lordes maiores (Lorde Elder, Lorde Aqili, Lorde Han) todas tinham corpo, roupas e arames, mas nenhuma tinha cabeça, uma vez que a glória dos Lordes é tão grande que poucos boracs especiais podem ter “a honra de vê-los!”. O chão, por sua vez, era razoavelmente limpo e algumas colunas adornadas com mármore e granito, no púlpito iam alguns utensílios de ouro. Apareceu então o pregador, era um borac de chifres grossos, mas não altos pois haviam sido raspados, tinha uma expressão de seriedade em seu rosto e andava lenta e cerimoniosamente e vestia-se com uma enorme túnica dotada de uma enorme capa, por isso andava devagar. Atrás dele, uma banda tocava uma música lenta, cerimoniosamente e sem graça um hino em homenagem a Elder e sua vitória contra o líder dos traídores “O Lorde das Trevas” na Guerra dos Traidores, era mais ou menos assim:
“Por sua grande vitória!
Tendes misericórdia de nós!
Lutamos por sua vitória!
Mas tende piedade de nós!
Somos imperfeitos, impuros, incompletos e burros!
Mas nós te adoramos! Por que tendes piedade de nós!”
Quando, finalmente, a música acabou, fez-se um clima de tensão, tudo ficou quieto e as luzes se apagaram, o mestre do templo ficou firme e então disse:
--Oh! Lorde Potens! Lorde de Porto de Pedra! Queremos que o senhor nos dê sua graça a essa cerimônia, para que possamos saber se estamos de acordo com vossa vontade e dos outros Lorde!
Uma luz então surgiu do teto, não de uma lâmpada mas simplesmente do nada, uma brisa começou a correr do púlpito emergiu disso uma voz que disse com poder e magnificência:
--Dou minha graça para que a cerimônia se realize. Tudo está nos conformessssss!....
A voz e a luz sumiram e tudo voltou ao normal, apesar disso, ninguém se surpreendeu, as cerimônias semanais eram sempre assim, a exceção do Lorde, que variava de cidade para cidade. Começou, então, a primeira parte da cerimônia, na qual ele agradecia a cada um dos Lordes por existir e ter misericórdia deles, o que durava em média uma hora, já que cada cidade tem seu próprio Lorde o que significa que ele teria que agradecer a mais de trezentos e quarenta e dois deles. Depois, vinha a segunda parte da cerimônia, no qual eles cantavam um hino aos Lordes (mais ou menos como a anterior, só que muito, muito mais longa). Por fim, veio a terceira parte e está nos interessa:
--Agora...--sua voz era grossa, sendo simultaneamente respeitável e poderosa, mas um tanto chata--...devemos chegar a última parte da cerimônia e como todos que estavam aqui semana passada sabem, terminamos o ciclo das cerimônias a uma semana, então, iremos reiniciar o ciclo de cerimônias da maneira habitual, com uma retrospectiva do nascimento do Cosmos...
--Ãhhhhhh!!!!--todos gritaram de angústia, porque alêm de muito longa, aquela sempre era a parte mais chata, pois todos sabiam aquilo de có e já estavam cansados de ouvir.
Naquele momento, as luzes se apagaram de novo, o vento se reiniciou, mais forte, e a mesma voz voltou a falar:
--Foi mera imprensão minha ou há alguém aqui querendo desafiar o desígnio dos Lordes!? Há?!?!
--......--todos permaneciam calados por motivos óbvios
--Hã?!
--....
--Acho bom!... Continuem a cerimônia da maneira que foi estipulado!
Uma vez que a voz e a escuridão se foram, o pregador retornou ao que falava antes:
--Bem.... Prosseguindo.... Tudo começou antes mesmo do tempo existir.... Do espaço existir!... Nesses tempos, os Lordes viviam em sua própria realidade, uma realidade inatingível para criaturas simplórias e imperfeitas como nós! Mas uma realidade vazia de significado. Uma realidade triste e monótona, quase sombria, até que, de maneira que talvez nunca venhamos a descobrir, surgiu Elder! Pai! E líder de todos os outros Lordes que surgiram a partir dele! Juntos! Eles ergueram a maior sociedade possível, mais poderosa e avançada do que qualquer coisa imaginável por seres mortais mortais e carnais como nós! Após muitos e muitos éons a sociedade deles chegou ao ápice absoluto tendo conquistado todo o conhecimento e tecnologias possíveis, mas encarou então um terrível problema: “o que fazer?” já não haviam mais desafios a serem enfrentados ou territórios a serem desbravados.... Uma melancolia se abateu sobre os Lordes.... Foi nesse momento, nesse exato e incrível momento, que Elder, sentado em seu Trono de Glória, teve uma visão, a visão de um novo objetivo! Um novo desafio! A maior conquista de todas! A maior e mais gloriosa! Não de uma cidade, não um continente, ele visualizou toda uma nova realidade! Um novo universo, onde ele e seu povo seriam senhores absolutos em todos os níveis! Reinando com suas próprias Leis da Natureza! E assim, eles se empenharem e com grande esforço, eles construíram a Máquina do Cosmos! Uma criadora de realidades e de mundos! Uma construtora de universos! Eles a ligaram a maior fonte de energia que despunham e entraram na máquina e então, construíram o Primeiro Cosmos! Um grande mundo plano, com florestas, campos agricultáveis, minérios, água fresca e petróleo a vontade!... Nesse universo se estabeleceram poderosas raças das quais vocês já ouviram falar e elas construíram espetaculares estruturas que ainda hoje não conseguimos imitar! Os canais de irrigação dos Kark! As Torres dos Burbs que iam alêm do céu e as colossais fortalezas e palácios dos Grinard! Tudo isso, enquanto assistiam tudo do Alêm, o seu próprio palácio de Glória e Poder estabelecido alêm do que podemos alcançar e assim a Antiga era se passou.... Mas então, chegou ele... Aquele cujo nome não deve ser dito, aquele que vós deves sempre chamar de “Senhor das Trevas”.... Ou “Lorde das Trevas”, tanto faz, o que importa é nunca ouvir nada do que ele diz! De origens desconhecidas, essa abominação!...--enquanto falava músicos tentavam dar um ar dramático a suas palavras enquanto outros subalternos faziam um pequeno show de luzes--... é, ou era, um Lorde, mas que por sua própria ambição louca de querer mais conhecimento para sí e mais ninguém acabou se contaminando com químicos terríveis virando uma besta tão hedionda e corrupta que apenas olhar para ele pode lhe causar uma terrível doença! Foi expulso do meio dos Lordes e banido para alêm do vazio!.... Mas um dia, a mais de mil anos atrás!, ele voltou e com sua voz, a mais terrível de suas armas, ele corrompeu todos os reinos do Primeiro Cosmos! Declarando-se rei deles, formou - se assim o Exército dos Traidores! E assim! Em 25 de maio do último ano da Antiga Era, o ano de mil oitocentos e setenta e seis, ele iníciou a Guerra dos Traidores que marcharam contra os Lordes! O maior crime de todos! Cometido em massa! Ele, cujo nome nunca deve ser dito, abriu assim um portal para o Alêm e assim os traidores marcharam, armados até os dentes, contra aqueles que eram seus criadores e maiores benfeitores! Morderam a mão que os alimentava! A luta se estendeu por décadas! Não uma luta comum! Mas uma luta cruel, sanguinária, tão brutal, tão poderosa, que até mesmo Lordes caíram mortos. Com a morte destes Lordes, as leis que regiam o universo começaram a falhar e assim a gravidade e a luz principiaram a morrer, nasceu a Noite e seu líder absoluto era....Ele... Parecia que a vitória iria para as Trevas, mas então, Lorde Han teve a ideia que lhe colocaria na história como um grande Lorde! Escapando da batalha, Han se uniu a Elder e juntos eles ergueram... a primeira Cultivadora.... Uma máquina só vencida pela própria Máquina do Mundo,....e dessa máquina, saíram os primeiros boracs, mas eles não tiveram o luxo que temos hoje de desfrutar da vida! Não! Foram treinados e enviados para a luta! Eram eles mais de duzentos milhões! Uma segunda luta se estabeleceu, bilhões morreriam, tudo começando com...--nesse momento se seguiria uma explicação de duas horas sobre cada batalha da guerra então vamos pular e ir para o que nos interessa--...E então, quando Djur colocou aquela tocha sobre o barril de pólvora, sabia que era seu fim, mas com aquilo, explodiu os muros da Fortaleza das Sombras e com isso Ele foi derrotado... Humilhado, fugiu para o meio das trevas, onde se esconde até hoje, devorando os espíritos de todos aqueles que atravessam aquelas cavernas perigosas.... Mas com o final da guerra veio o júbilo e a glória! E como sinal de agradecimento! Os Lordes não apenas nos deixaram viver, como também ergueram no meio da Noite, o Segundo Cosmos! Para nós habitarmos e cultuarmos a eles! Novas cidades nasceram então! E com elas, novas Cultivadoras que juntas formaram a história que conhecemos... Obrigado e boa noite.
Kar e Bouc, que ja estavam com dor nas pernas, levantaram-se as preças e aplaudiram para ir embora, mas quando se viravam para sair viram Ox já dormindo pesadamente, acordaram-no e riram-se dele e seguiram o atormentando até a pensão. Nem no caminho, nem na charutaria ou mesmo nas ruas viram Joh e foram dormir desapontados.